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o tempo de uma gaveta aberta
é o tempo de uso de uma gaveta aberta
é o tempo de uma gaveta em uso
agora fechada a gaveta guarda
o tempo para trás levou
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érica zíngano | francine jallageas | ícaro lira | lucas parente

quinta-feira, 25 de junho de 2009

hoje dormí como um condenado e em resposta aos meus sonhos comecei a escrever isso. ainda não tá acabado e na verdade acho que nunca vai estar. muitos números pra seguir inventando. talvez a primeira parte esteja de pára-quedas no meio dos demais números. talvez seja mais legal pular e ler só "dos robôs e dos demônios" e "das ilhas de edição". de qualquer jeito fiquei com vontade de enviar. acho que philip k dick tá corroendo o meu cérebro. sulcos... ai... as ilhas... beijos coletivos! lucs HIPERMODERNIDADE... IDADE... IDADE... (Alguns clichês): I. (do incêndio). Niterói, 17 de dezembro de 1961. Na platéia do Gran-Circus Norte-Americano havia cerca de 3.000 pessoas. Um ex-empregado do circo ateou fogo na lona, criando gotas de chama que caíam do tecido inflamável. Morreram 317 pessoas no ato. Depois, com as feridas, nos hospitais, mais uma centena. Um espírito chamado Humberto de Campos, escrevendo através das mãos de Chico Xavier em seu livro de Cartas e Crônicas, disse que o acontecimento se deu devido a um carma coletivo, pois seriam os mortos a reencarnação de uma multidão de romanos que, num circo armado no ano de 177, por debaixo de uma encosta depois conhecida como colina de Fouvière, em Lion, queimou cerca de 1.000 mulheres e crianças cristãs amarradas na arena. Por outro lado, para José Datrino, empresário do setor de transportes de carga do Rio de Janeiro, o circo pegando fogo foi uma grande metáfora divina, em que o circo seria o próprio mundo em combustão, como em Isaías, 34, 4, 9-11: As torrentes da terra mudar-se-ão em pez, e sua terra em enxofre; o chão tornar-se-á pez que arderá dia e noite; jamais se extinguirá, e sua fumaça subirá de geração em geração; (ela) será transformada em deserto por toda a eternidade, e jamais alguém passará por ali. Será domínio do mocho e da garça, a coruja e o corvo habitá-la-ão. O senhor estenderá sobre ela o cordel da destruição, e o fio de prumo da desolação. E ali mesmo, José Datrino tornou-se o profeta Gentileza, plantando um jardim onde só havia terra batida e queimada. E dali foi à Avenida Brasil, pintando as pilastras dos viadutos, abençoando e acalmando os ônibus e caminhões com suas palhas de coqueiro. Talvez Gentileza seja a figura mais conhecida no Brasil em termos de profetas urbanos. Mas ainda outra pessoa emblemática surgiu do circo em chamas. Pois a maioria das pessoas que sofre de queimadura tem que passar por cirurgia plástica e, nesta época, Ivo Pitanguy estudava queimaduras devido à preocupação geral com relação ao perigo atômico. Nunca ninguém havia utilizado pele liofilizada, pele congelada, neste tipo de trabalho, e Pitanguy, tendo encomendado 35 mil centímetros de pele dos Estados Unidos (que possuía o material, mas nunca havia utilizado), coordenou o Centro de Tratamento de Queimados no Hospital Antônio Pedro em Niterói. Foi o grande batizado de Pitanguy como um dos mais importantes cirurgiões plásticos do mundo, figura mítica das calçadas de Ipanema. Hoje em dia está morto Gentileza, alguns de seus murais apagados, outros recuperados, enquanto que Pitanguy continua, mesmo depois de morto, através de seus discípulos, a alterar os rostos mais conhecidos da Terra. A plástica como forma de esconder a morte. Como marca que dissolve e aniquila a marca. Na realidade, se pensarmos bem, podemos comparar Pitanguy com Doctor Frankenstein, e o profeta Gentileza com Doctor Jekyll & Mister Hyde, já que um produz a alteração do corpo, utilizando-se de diversas fontes de pele, e o outro é a esquizofrenia mais intensa, mesclando pacifismo com ódio – no filme CIRCO de Arnaldo Jabor, vemos Gentileza gritando com toda uma ferocidade ao lado de seu caminhão azul. E falo isso de acordo com o fato de serem estes os três paradigmas da hipermodernidade: o médico e o monstro, o doutor Frankenstein e sua criatura, além de Drácula e suas mulheres. A esquizofrenia, a cirurgia plástica, e a obsessão fetichista. Neste sentido Chico Xavier seria Drácula? II. (do terrorismo). “Imaginava que em tempos como este os nossos pensamentos seriam mais sublimes. Quer saber o que estou pensando?” (últimas frases de Antoine Monnier em “Le diable Probablement”, antes de levar uma bala na cabeça). Fassbinder, em The Third Generation, fala de uma nova forma de terrorismo. O filme é dividido em 6 capítulos que surgem acompanhados de textos por sobre imagens congeladas. Trata-se de textos retirados de banheiros públicos de Berlin, textos que falam de sexo e política de maneira intrincada. Os verdadeiros terroristas do filme são o vendedor de computadores e o agente do serviço de inteligência alemão. Do outro lado temos um bando de anarquistas sem rumo, que exercem o terrorismo como brincadeira de criança, como divertimento adolescente sem ideologia. Acontece que o agente é pai de um dos anarquistas principais, e o empresário de computadores se utiliza de seu próprio seqüestro para aparecer e sorrir na televisão. O filme, aliás, está repleto de televisões e computadores, em que vemos outras tantas imagens. Uma delas, de “Le diable probablement” (de Robert Bresson) vem somada ao comentário de Hanna Schygulla que diz que “é tão triste”, e à resposta do empresário, o mesmo ator de Alphaville, que diz que “enquanto os filmes sejam tristes, a vida será feliz”. Depois ainda o mesmo personagem diz que o cinema é uma mentira em 25 quadros por segundo. As coisas são idéias mentirosas apresentadas como verdade. Uma verdadeira utopia. A minha utopia. O controle da informação através do espelhismo. A tecnologia e os serviços de informação estão interconectados de uma maneira tão embrenhada quanto sexo e poder. O poder que se utiliza do terrorismo para fortalecer-se, para ser ainda mais poderoso, para controlar de maneira mais direta a sociedade e sua psicologia. O sexo sadomasoquista entre o serviço de informação e Hanna Schygulla, sua secretária-terrorista. O homem mais grotesco com a mulher mais bela. A luz vermelha que entra no quarto de hotel. III. (do quarto poder). Já ninguém fala da gripe porcina. Fora do México, na Europa e na América do Norte, a gripe teve quinhentas vítimas, das quais apenas uma senhora morreu. Uma gripe normal. Uma necessidade de aumentar as ações das empresas de remédios virais. Como quando dos virus informacionais, em que a doença vem atrelada à cura. Tudo em nome da especulação. E Ronald Rumsfeld, um dos maiores acionistas e dono de uma grande empresa de remédios virais. Parabéns, Rumsfeld. Mais uma vez a tecnologia da guerra (a medicina e o exército) unida aos meios de informação (os jornais controlados pelo pentágono). IV. (dos shoppings). No futuro próximo estaremos divididos entre os possuidores de cartões e os despossuídos. Os cartões não apenas como forma de rápido acesso a contas bancárias, mas também como memória oficial, como banco de dados que possibilita um maior controle da massa consumidora. Na realidade já existem shoppings em que só entram pessoas com cartão de crédito – através de sensores localizados nas diversas entradas. Os cartões. Todos com cartões. V. (das ilhas de edição). Meu nome é José de Almagro, sou cordobês e tenho 38 anos. Tenho vivido numa ilha de edição. Há quinze anos trabalho para o SGAE, onde realizamos filmes para diversas produtoras. Na frente do edifício há um cartaz que fala do SGAE como vampiro dos direitos autorais. Não é tão simples assim. Não é só dizer “cultura livre para todos”. Eu não quero ser o programador de minhas próprias ferramentas. De um lado detesto o Mac, porque vem tudo pronto. Por outro lado não tenho mais idade para quebrar a cabeça com o Linux. De qualquer jeito eu trabalho aqui, mas não me envolvo com os negócios do SGAE. Simplesmente é a melhor das ilhas de edição. Faço Yoga e acumpuntura duas vezes por semana. E não é porque considere Barcelona uma cidade muito estressante. Pelo contrario. Isso daqui é um jardim se comparado a Buenos Aires. Acontece que tenho duas hérnias de disco e tenho medo de ficar velho. Antigamente era quase impossível uma pessoa ter duas hérnias de disco. Uma já era raro. Mas hoje em dia, com a postura que temos, com a profusão de ilhas de edição, com a sistemática substituição de nossos pés por nossos olhos, o horizonte se modifica. No futuro creio que teremos que arrancar alguns discos assim que nascemos. Porque senão, ao crescer vamos sofrer demais. Eu mesmo passei por diversos hospitais, tomei todos os tipos de remédio, todos eles com morfina, enquanto fumava maconha pra não ficar tão mareado. Era só fumar um baseado que já não vomitava tanto. Tinha todos os tipos de sonhos e até mesmo visões. Alguma coisa numa praia se repetia. O mar violento e marrom escuro. E o curioso é que sempre via o código de tempo nesses sonhos. Como se nunca tivesse saído da ilha. Ne verdade, bem ou mal, uma ilha é justamente um paraíso sem saída... Tenho tentado medicina alternativa. Mas acontece que essas coisas aqui em Barcelona são muito caras. Penso em voltar pra América do Sul. Mas por outro lado a edição lá é muito mais intensa e mal paga. Já não posso voltar a trabalhar como antes, virando noites seguidas. Acho que já não sei mais o que é um lugar aberto e sem ar condicionado. Mas de qualquer jeito não tenho como parar de editar. Se pudesse faria isso. Mas é a única coisa que sei fazer. VI. (dos robôs e dos demônios). Outro dia um menino ficou tanto tempo ligado no Skype que quando saiu teve crise de pânico. Conversava com três, quatro, e até cinco pessoas ao mesmo tempo. Gravava as conversações e as repetia para poder melhorar o seu tom de voz de acordo com o microfone e os autofalantes. Modificou os objetos do seu quarto de acordo com a webcam. Raspou a cabeça e passou a usar chapéu. Mudou de nome de acordo com o nickname. Agora seu nome era apenas uma letra. E passou expressar suas idéias de maneira mais automática, como se estivesse sonhando acordado. Começou a calcular o tempo até poder dizer tudo da maneira mais rápida e direta possível, numa espécie de jogo em que não havia espaço para os intervalos. Mas isso já tinha treinado com celulares. Se apaixonou por uma ou duas mulheres através do Skype. Mandou flores através de emoticons. Tinha os pelos arrepiados. E depois de um tempo berrava pelo telefone visual. Todos os dias se converteram em noites e todas as noites eram dias. Os pixels já eram parte da fisionomia de cada pessoa. Algumas diziam alô alô e ele sorria (“alô” era tão antiquado...). Até que um dia um certo olhar, uma pergunta em forma de gesto, uma interferência. E despertou com a tela quebrada. O cristal liquido derramando no chão. Os olhos esbugalhados. A sensação de pressão na cabeça. A cabeça vazia. As pernas e os braços enormes e finos - assim como o membro. O tronco encolhido. Desaprendeu a andar. Ou simplesmente já não podia. VII. (dos passos e das torres). Hoje fiz pesquisa de locação através do Google Earth. Fui caminhando pelas ruas de Madrid até encontrar o que queria – uns terrenos baldios perto da estação de Chamartín, mais precisamente na Avenida de Burgos, de onde se vê uma central elétrica e as quatro torres mais altas da Europa. Parece que metade de Madrid trabalha nestas torres, que são tão altas para cima quanto para baixo – basta entrar no google earth e subir pelo Paseo de la Castellana para dar uma olhada. Curioso o fato de uma delas se chamar “Torre Espacio”. São todas espelhadas. Se continuarmos evoluindo como parece que vamos, se as torres tiverem o mesmo futuro de La Defense, os vidros deixarão, então, de espelhar o mundo exterior, e apenas reterão calor. Um fenômeno interessante. Outra coisa é o cinema de replicantes, que pode chegar a concretizar-se através de um ataque terrorista do ETA com quatro aviões ao invés de dois. Mas desviei de assunto. Pois pretendo repetir a viagem de Cortazar e Dunlop de Paris a Marsella pelo Google Earth. E depois morrer de leucemia. VIII. (do sono). Existe aquela doença em que, quanto mais stress, mais sono. De repente me vejo numa situação difícil e desmaio, começando a dormir sem que ninguém possa me acordar. Se chama narcolepsia e não tem cura. Começou como se não fosse nada. Durante uma semana fiquei dias sem dormir, até que, na sexta-feira, me deitei, super-tenso, pensando que não ia dormir e, de repente, desmaiei. Acordei no sábado às sete da tarde. Pelo menos o sol estava se pondo às 9 e meia, de forma que ainda tinha duas horas de dia. Daí virei a noite e fui dormir no domingo às duas da manhã. Acordei na segunda às cinco da tarde. Voltei à ilha de edição. Mais uma semana sem dormir. E tudo se repetiu. Depois disso passei a ter esses desmaios. É como se meu corpo tivesse medo de não dormir e me forçasse a cair na cama. E o pior é que nem sempre é na cama. Já dormi na ilha, nas ramblas, na estação da praça de Espanya, no porto, na linha 4 do metrô – que é 24 horas sábado –, enfim. Hoje mesmo acordei com José de Almagro e Català entrando na ilha. Já não tenho mais vergonha. O pior é que tenho tido dores nas costas por causa disso. IX. (dos HDs e dos RAMs). Ontem à noite, durante o amanhecer de hoje no Japão, foi realizado o primeiro implante de memória artificial num ser humano. Após 7 anos de testes em golfinhos, o doutor Hatsumaru, do Centro de Neurologia Espacial de Tokyo (CENRE), estava convencido de que poderia ser realizada a primeira operação num homem. O voluntário para tal operação permanece anônimo, ainda que o CENRE afirme que não tardará em divulgar os resultados, já que até o dado momento parecem positivos. Trata-se da inserção de um HD desenvolvido pelo Centro especialmente para a operação. De acordo com o doutor Hatsumaru, o implante possibilitará a memorização automática dos cinco sentidos (audição, tato, visão, olfato e paladar) além de pensamentos – de maneira que os escritores não necessitarão mais de máquinas de escrever e nem os turistas de máquinas fotográficas. Durante seu pronunciamento na televisão japonesa, o Dr. Hatsumaro chocou a opinião pública devido à sua sinceridade: “Durante os próximos dias o Centro estará realizando testes com relação à reprodução destas memórias, ou seja, se um gosto amargo é rememorado, ele deverá ser reproduzido de maneira exata, porque se não, teremos de retirar de imediato o HD do paciente, evitando quaisquer danos possíveis, principalmente com relação à sua memória táctil.” Para muitos tal operação é um escândalo irreparável, já que devido a tal aparato um ser humano poderia ser invadido por desejos e memórias fantasmáticos sem a possibilidade de um controle. Outra crítica talvez ainda mais enfática é a de que o governo japonês e, por conseqüência, o governo dos EUA, poderá controlar e até mesmo alterar a memória das pessoas – julgando réus sem a necessidade de testemunhas, por exemplo. Por outro lado, muitos crêem que este pode ser um passo decisivo para a compreensão de uma série de fenômenos, como os sonhos, as neuroses, e até mesmo o alzheimer, levando-nos a possíveis curas para diversas psicopatologias. O CENRE já desenvolve um projeto para o implante de memória RAM em seres humanos, o que aumentaria em até 100 vezes a velocidade máxima de uma sinapse..

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